sábado, 24 de dezembro de 2011

Sola Scriptura: A Bíblia como elemento fundante da Reforma Protestante.


Só a Graça, Só a fé, só Cristo, só as Escrituras, só a Deus Glória. Estes são o lema da Reforma Protestante. Lutero e os demais reformadores tornam as Escrituras elemento fundamental contra qualquer deturpação do conceito soteriológico e prático da Religião Cristã. A Escritura insurge importante, haja vista que, nela as quatro outras sentenças se justificam e tornam-se fundamentais na distinção entre a fé protestante e os ideais humanos. A Escritura Sagrada revelou-se a haste onde a Reforma Protestante fincou a bandeira da Verdade sobre o monte da glória humana.

Embora a Reforma Protestante seja complexa e heterogênea e seu projeto vá além da reforma doutrinária da Igreja, não se nega tratar, mormente, de uma volta às Escrituras Sagradas. O movimento reformista exigia a existência de uma fé sem “muletas espirituais”, confiança incondicional à total graça de Deus alcançada unicamente por meio da graça de Cristo, cuja ação humilhava a arrogância humana (ICor.1,2,3). Uma fé que em qualquer esfera de vida glorificasse a Deus (Ef.4:1;Col 3:12ss;I Ts.2:12;II Ts.1:10; IPe.1:15).
Com o 'sola Scriptura' os reformadores afirmavam que as Escrituras eram a autoridade final e suficiente da Revelação de Deus aos homens. Não mais Igreja ou Tradição dos Pais da Igreja somam autoridade, mas só as Escrituras.


Em síntese, isto põe qualquer homem ao alcance da interpretação bíblica, ou seja, o 'princípio do livre exame' do texto sagrado. Os reformadores defendiam que todos o cristão é livre para, sob orientação do Espírito Santo, examinar a Escritura divina, bem como interpretá-la independente de uma autoridade eclesial externa (Jo.16:12,13; At. 17:11,12).


À preterir os pré-reformadores e firmar atenção em Lutero, sua biografia e teologia (esta, percebida em seus sermões) vê-se a profunda vivência deste homem com as Escrituras. Lutero sabia que sucesso algum obteria se não andasse sobre a Palavra de Deus (Jos. 1:7,8).[1]

I- Elenca-se, a partir de agora, aspectos importantes da Teologia Bíblica de Lutero que sustentou a Reforma e cuja a aplicação ainda é relevante:

1- A influência de Agostinho de Hipona na vida de Lutero:
Se Agostinho se converte a Cristo depois de confrontado com a leitura de Rm.13:13-14, Lutero recorda o Bispo ao se converter depois de 'perseguido' pelo medo da ira de Deus registrada em Rm.1:17. O medo se desfaz depois de descobrir que a Justiça de Deus neste texto é positiva e não negativa (Rm.1:18). Esta justiça é alcançada nos méritos de Cristo e não, conforme aprendera, através de esforços humanos (Rm.3:21-26;II Cor.5:18;Ef. 2:1-10).


Segundo Hagglund, as doutrinas da graça ensinadas pelos escolásticos não satisfaziam ao anseio de Lutero. Essas doutrinas ensinavam que “se alguém fizesse tudo o que estava a seu alcance, usando seus próprios poderes, Deus então também lhe daria graça” (Is.64:6; Rm.9:16).[2] Lutero sabia que o homem, por seus próprios poderes não podia, segundo a sua própria vontade, amar a Deus( Mc.7:6,18,21-23). Os dons naturais dos homens estam depravados (Rm. 3:12;7:18,19;Ef.2:1,5)!


Depois de reconciliado com o texto de Rm. 1:17, Lutero apóia-se na teologia de Agostinho e opõe-se à posição escolástica acerca da justificação, pecado e graça fundamentados em pressupostos pelagianos. Lutero afirmava que:


2- O homem não tem capacidade de amar a Deus com suas próprias forças:
É característico do homem natural amar a si mesmo e ao mundo e opor-se a Deus (Jo.17:14,Ef.2:1-3;Tg.4:4;I Jo.2:15-17,3:1;4:5;5:19). É necessário, primeiro, receber a graça de Cristo para que as afecções de amor inclinem a vontade humana a fim de amar corretamente a Deus. Em Cristo, a graça precede a vontade, o que resultará no amor que Deus aceitará da parte do homem (Ef.2:1ss). Aceitar que o homem, em sua natureza, tem a capacidade de amar ou se preparar para a graça é tornar o Evangelho nulo e vão, acreditava Lutero (Rm.1:19-32;3:23).Para alguém fazer algo de bom, deve se tornar bom primeiro (Jr.13:23).Mas,“O homem está completamente depravado”, dizia Lutero.[3]


3- Justificação- conceito principal da teologia de Lutero:
A justificação não é ato recebido a partir daquilo que o homem faz ou busca, mas por tudo o quanto Cristo realizou na cruz (Rm.3:4,20,22,24,26;8:33; II Cor.5:21;Gl.2:16;3:8,11).


Logo, a justiça descrita em Rm. não é a justiça que julga e faz exigências, mas a justiça alcançada pela graça. Esta justiça se fundamenta na Pessoa de Cristo. É por isso que Lutero salienta que o homem em Cristo não se torna justo; antes, é declarado justo (Rm.3:24,28). Deus age com a “justiça supra excelente”; isto é, aquela justiça que exige do próprio Deus uma ação que vai além da justiça comum (Rm.25,26). Trata-se daquela justiça que a Sua Asseidade lhe exige.
Assim, a fonte da salvação encontra-se não no poder exercido arbitrariamente por Deus, mas no sofrimento substitutivo de Cristo e no perfeito mérito que Ele conquistou (Rm.5:1,8,11;IICor. 5:15,18,19;Col.1:20;Hb.7:24-27).


4- A Antropologia teológica de Lutero:
O conceito de homem para Lutero segue intrínseco à doutrina da justificação. Lutero foge à característica medieval quanto a composição do homem. Para ele, não é questão de dicotomia ou tricotomia; o homem é um todo (totus homo). Qualquer tentativa distintiva da identidade antropológica é uma descaracterização do “ser- Homem” (Gn.2:7). Adão é criado com um corpo material/espiritual. Qualquer tentativa de escanchá-lo é desfigurar aquilo que o homem nasceu para ser (Mc.12:30).


Consequentemente, com a não-distinção dualista do homem, Lutero pode lançar luzes à facetas de sua teologia característica:
(A)- O pecado original: Não atingiu o espírito ou o corpo do homem, mas o Ser como um todo. Trata-se de uma corrupção concreta que imprime a sua marca no homem inteiro (Rm.3:9-18;7:17-25;IJo.1:8).


Por se tratar do homem como um todo, o mal não é apenas a ação realizada por Adão ao comer do fruto que Deus proibira no Éden. Ações de pecado são o reflexo daquilo em que o homem se tornou, essencialmente um ser-pecado. Adão pecara anterior ao comer do fruto. Comê-lo foi a sua exteriorização (Gn:3:6;Tg.1:15).


Deste modo, o homem não é julgado só pelo que pratica, mas por aquilo que agora é. O pecado tornou-se parte constitutiva do Ser (Sl.51:5). Tal pecado (corruptio naturae) abandonará o homem somente quando este baixar à sepultura ( Fil. 3:3:12-16,20-21).


(B)- Depravação Total: a corrupção natural herdada no Éden fora capaz de apagar a imagem de Deus ( imago Dei) no homem:
Lutero considerava a Imago Dei não como capacidade racional ou talentos que caracterizam o homem como imagem de Deus. Para ele,a Imago Dei é a justiça original, perfeição e santidade originais no homem, os quais, depois da queda, não mais o remontam como tal. Isto infere, pois, um homem, agora, sem a identidade do Ser (Gn.3:7ss).

O reformador reconhecia que Agostinho utilizara da classificação aristotélica, segundo a qual a imagem de Deus no homem representava as faculdades da alma; i.é: memória, intelecto e vontade. Tal tríade, elementar na constituição do homem após a queda, era a imagem de sua total depravação. Esta concepção 'pessimista' do homem focaliza a total dependência da raça humana na suficiência de Cristo (IICor.3:5;Jd.24).


(C)- Cristo torna-se vital na recuperação do depravado homem: Cristo cumpre em si a justiça de Deus. Nele o homem é declarado justo. Do contrário, como o homem poderia se livrar daquilo cuja a natureza “tornara hereditário (a natureza pecaminosa) nele (Jr.13:23;Rm.5:12ss)? Lutero dizia que os crentes tem gradualmente diminuída a sua pecaminosidade porque vive sua nova vida no Espírito (Rm.5:18,19;8:29; Ef.4:13;5:27;Col.1:28).


Contudo, os fiéis são simultâneamente pecadores e justos (Rm6:6,11-14;Ef.4:22).[4] Pecadores devido a sua natureza humana corrompida e, justos,[5] devido os méritos de Cristo ao satisfazer em si a justiça de Deus. Conforme Hagglund, “pecado e justiça são portanto atributos perpétuos no homem inteiro.”[6]

5- A competência da alma ou o sacerdócio universal do crente:
Depois de ter sido declarado justo em Cristo, o cristão vê a sua vida aceita por Deus (Hb.9:26,28). Cristo garante o acesso do mais novo filho adotivo perante o Seu Pai (Rm.8: 16,17;9:8; Gl.3:26;4:7;Hb.2:13,14;10:19-23;12:7,8;I Jo.3:1,2).


Assim, o crente pode, por si mesmo, oferecer culto aceitável a Deus e viver em comunhão (Rm.12:1; Hb.13:15;IPe.2:15), não mais com um Deus que exige mediante a Lei aquilo que homem algum lhe pode oferecer: a auto-justificação (Hb.9:1ss). Devido à satisfação divina no Filho (Is.53:11;Mt.3:17;12:18; IIPe.1:17), o crente é o seu próprio sacerdote e Cristo o único intermediário entre Deus e o homem pecador (Ef.3:12; Hb.10:19;I Pe.2:5,9;Ap.1:5,6).


6- Razão e Fé: o caráter dialético e paradoxal existente no conhecimento da Revelação de Deus para Lutero:
Não se pode negar que a Reforma, a partir de Lutero, abriu caminho não só para uma vida de transformações morais e espirituais. A Reforma também grassou a Ciência. Richard Hopkins afirma que a Ciência (e o ceticismo) viu na Reforma, livre do domínio da Igreja Romana, a liberdade para o seu progresso. Como reagir a este horizonte novo e 'ameaçador' à fé cristã? Lutero parece ter adotado a interpretação de Agostinho acerca da Razão e Fé: “crer para entender.”


Isto significa que qualquer forma de conhecimento ou sabedoria são dádivas divinas (Tg.1:17). Embora critique Aristóteles e outros filósofos, Lutero não demonstrara ter desprezado o que de bom aprendera com as suas leituras (ITs.5:21). A sua noção de conhecimento de Deus (absconditus e revelatus), além de uma fundamentação bíblica, é agostiniana, bem como, corroborada na filosofia de Guilherme de Occam e dos nominalistas. Para Occam, a Fé não ajuda a Razão na compreensão dos elementos naturais, mas é útil somente para o conhecimento da natureza de Deus.


Foi com as Escrituras, antes de tudo, e este postulado filosófico que Lutero discutiu com Erasmo de Roterdan a Revelação de Deus mediante as Escrituras, tão somente.
Erasmo defendia a possibilidade de a razão humana poder compreender a Deus sem o auxílio de uma Revelação. Contrapartida, Lutero advogava que, devido o pecado, a perda da imago Dei torna a compreensão de Deus impossível. Enquanto o conhecimento da Fé se baseava na Autoridade, o conhecimento da Razão estava obscurecido pela corrupção natural, herança adâmica. Assim, somente através da fé realizada no homem e, não pelo homem, a Razão ocuparia o seu derradeiro lugar.


7- As Escrituras para Lutero:
Conforme já observado, todo o pensamento de Lutero parte do pressuposto teocêntrico e do princípio da Bíblia como a autoridade única . Fora com este pensamento que a Reforma logrou êxito.

O que havia de novo na atitude de Lutero face à Escritura era especialmente sua percepção mais profunda com respeito ao seu conteúdo. Além disso, Lutero reconhecia que a autoridade da Palavra era válida mesmo quando a tradição divergia dela; que a sua autoridade mantinha cativa a sua consciência.[7]

7.1- Pode-se destacar dois aspectos importantes na interpretação de Lutero quanto a Sagrada Escritura:
(A)- Cristo é o Centro da Bíblia:
Se o Antigo Testamento é a sombra do Novo, não encontrar Cristo no A.T. é ver somente a escuridão. Lutero considerava que o Antigo Testamento era testemunha direta de Cristo, e não que continha apenas algumas profecias a seu respeito. Faz sentido, pois para o reformador, pois o
padrão e a medida de toda a verdade é o Evangelho de Jesus Cristo, que é, antes de tudo, uma mensagem falada- a Palavra de Deus- e não “uma mensagem morta”.”


Lutero não se limitou a equiparar a Palavra de Deus com a Bíblia. Contudo, não relegou, tampouco, a Bíblia a uma categoria inferior [...]. Para Lutero a Bíblia é o berço no qual Cristo se encontra. Mas a Bíblia não é Deus, nem Jesus Cristo e nem o Evangelho. Estes estão acima do livro e o valor do livro encontra-se exclusivamente no fato de Deus usá-lo para instruir seu povo. Mas ele realmente o usa como nenhum outro livro e, por isso, sua autoridade está acima de todas as autoridades humanas.”[8]

O segundo aspecto importante na interpretação de Lutero acerca da Palavra de Deus é sua exigência hermenêutica, ou seja:
(B)- A norma interpretativa das Escrituras:
A fim de evitar qualquer contraponto interpretativo à questão de Deus e Cristo estarem acima da Bíblia, Lutero difere o termo “Palavra Interna” (interpretação legalista da Bíblia) daquilo que chama de “Norma externa obrigatória”.[9]


Alguns cristãos alegavam possuir a “Palavra Interna” como norma da interpretação da Bíblia. Lutero discordava, uma vez que nenhuma particularidade bíblica pode ser interpretada a partir do próprio leitor.[10]Assim, faz-se necessário uma petição de princípio como 'norma externa'. Esta é aquela condição da leitura contextual/histórica e gramatical, e não alegórica das Sagradas Escrituras.[11]


As más interpretações bíblicas da época fora o risco que o reformador teve que suportar ao evocar o livre exame das Escrituras. Se a Bíblia é a Palavra de Deus, escrita para o encorajamento e instrução do povo de Deus, todo o cristão tem o direito e o dever de lê-la e estudá-la.


7.2- Para evitar más interpretações bíblicas, Lutero estabelece dois Princípios hermenêuticos delimitadores na leitura bíblica:
(A)- Insiste no princípio da analogia da Escritura; i,é, a Bíblia interpreta-se a si mesma:
Este princípio impede qualquer interpretação particular daqueles ponto obscuros da Bíblia Sagrada, o que faz com que o leitor espere paciente pelo seu próprio elucidar;
(B)- O“livre exame” das Escrituras não implica em livres interpretações subjetivas ou baseadas em experiências místicas: A analogia da Bíblia é vital para apontar a sua autoridade como o único fundamento da fé cristã.


Objetivamos se a Reforma teve como principal personalidade Lutero ou a Palavra de Deus. O reformador se afana para que em suas ações a Palavra encontre vida própria. Ele reconhecia não possuir o poder da liberdade que a Palavra de Deus gozava (IITm.2:9). Provavelmente, como bem observa Colin Brown, o reformador não esperava que o uso das Escrituras tomaria dimensões tão amplas.[12]


II- A importância do “Sola Scriptura” de Lutero para nossos dias.
Lista-se abaixo, pelo menos, cinco fatores práticos que apontam à necessidade do “sola Scriptura” da Reforma, hoje:


1- Lutero inspira o cultivo de uma hermenêutica sóbria:
A hermenêutica de Lutero, respeita a Bíblia como a plena e infalível Palavra de Deus. Ela deve ser lida com respeito em seu contexto e aplicações atuais (II Tm.3:16).[13] Deve fazer um bem maior ao coração do que o faz ao intelecto (Sl 119:18,174).


O Rev. Héber Campos nos lembra que, “ os ensinos da Bíblia não são verdades que atingem meramente o intelecto, mas elas descem ao coração, fazendo com que elas se evidenciem em matéria prática de vida.”[14]


É um desafio para a igreja de hoje declarar mediante palavras e atitudes concretas a sua fé na Palavra de Deus (Jo.17:6-26), uma vez que o mundo exige dos homens cada vez mais uma atitude subjetiva.


2- A Sola Scriptura de Lutero ainda evoca nos crentes de hoje a possibilidade de discussão ( Fé/Razão) num mundo pós-moderno:
O século XVI experimentou grandes transformações. Alicerces culturais, intelectuais, políticos e religiosos estavam sob escombros. Avançar no “novo mundo Moderno” era indispensável à sobrevivência de qualquer classe ocidental européia.


Lutero introduz neste mundo de transformações a noção de que qualquer conceito de sistema, idéias ou existência humana encontram o norte se orientados pela única Verdade, que é a Bíblia. De algum modo, o dogmatismo teológico luterano convive com êxito entre a fé humanista de sua época. Não podemos também demonstrar, àqueles que se opõem à nossa fé, as bases teológicas da verdadeira sabedoria ( Hb:11:1-3; I Pe. 3:15)?


3- O conceito de Autoridade bíblica de Lutero exige-nos um releitura de nossas vidas, prática e valores cristãos:
Lutero dizia que a sua mente era prisioneira da Palavra de Deus. Logo, o reformador encontrara sua liberdade somente na obediência à Palavra de Deus. Ir contra a sua própria consciência não era seguro nem correto (Rm14:22,23).


Conforme Heber Campos, “o norte de uma reforma dentro da igreja de Deus está, inquestionavelmente, relacionado à volta aos princípios sadios de fé e prática, propostos pela Santa Escritura. A fé tem que ser fundamentada numa consciência cativa à Palavra de Deus [...].”


Somente a Palavra de Deus é capaz de iluminar os pontos escuros de nossas almas e fazer-nos abandonar nossos vícios e más condutas (At.23:1;Rom.9:1;II Cor.13:8;II Tm.3:14-17;Tg.1:22; I Pe.1:23). Alguém já disse que a Palavra que nos liberta é a mesma que nos prende.


4- A Sola Scriptura é necessária pois, comporta líderes e membros como igualmente vocacionados no dever de glorificarem somente a Deus:
Quando se tem a Palavra de Deus como a Autoridade da igreja, lideres e liderados se respeitam, pois reconhecem que suas diferenças ministeriais (At.6:1-7), conforme a Bíblia, são possíveis de ação harmônica no corpo de Cristo (I Cor. 12:1ss). Líderes são tão passíveis de admoestação na Palavra como o liderado (Gl.2:11ss).O membro é respeitado como superior à liderança, pois inspira os cuidados desta (Fl.2:3;Hb.13:17;IPe.4:5). É disciplinado (edificado, exortado) não com imposição autoritária, mas através da admoestação bíblica (Rm.12:8;I Cor.14:3; IICor. 5:20;ITm.4:13; Tt. 2:15).


Enfim, as diferenças pessoais e posições ministeriais são respeitadas, o crente é estimulado à união por uma autoridade externa à organização eclesial; isto é, a Bíblia é a autoridade. Qualquer referência a constrangimentos em sua vida particular virá por parte da Escritura exposta (Sl 19:14;At.16:30-33) e não por apontamento direto e particular de outro crente. Não é a Escritura a voz de Deus, viva e eficaz (Hb.4:12; 12: 5)? Pode um crente acusar a Bíblia de ser injusta (Sl.119:60;Pv. 30:5)?


5- A redescoberta da Sola Scriptura conduzirá à reforma da Teologia e, consequentemente, do púlpito:
Para que haja verdadeira Reforma a Palavra de Deus deve ser devidamente interpretada (II Rs. 22). A pregação da Palavra é o revelar da Vontade Soberana cumprida em Cristo e proclamada pelos crentes para a glória de Deus. Assim,ela não pode ser auto-ajuda (Pv.16:2;Is.28:29;Jr.17:9,10;Jo.15:5;IICor.3:5;ITm.1:12-16), recitar de livros teológicos ou experiências pessoais. Estas coisas têm o seu valor, mas não têm validade universal. Será que Lutero e outros reformadores teriam tamanho êxito se pregassem contra os erros ou deturpações teológicas simplesmente empunhando seus livros e conceitos teológicos (Is. 55:1, Rm.1:16)?


Para Lutero, seus sermões e conceitos de nada adiantariam se não fossem firmados sobre a Palavra Eterna. Ele ensina aos jovens pastores de sua época que, as Escrituras Sagradas não podem ser compreendidas por estudo e talento. Portanto, seu primeiro dever é começar a orar e orar com o propósito de que, se for do agrado de Deus efetuar algo para a Glória dele- não a sua glória nem de outra pessoa-, ele lhe poderá conceder graciosamente uma compreensão verdadeira de suas palavras.”[15]

Conclusão:
Há em Lutero uma demonstração de seu comprometimento para com a Palavra da Verdade. A igreja pós-moderna não necessita de fé assim ? Nossos membros não anseiam por um púlpito como o de Lutero onde são convencidos de seus erros e pecados mediante a exposição das Escrituras (At.2:37)? Autoridades constituídas não temeriam ao Deus da Bíblia (At.26:28)? “Prega a Palavra”, era a insistência de Paulo a Timóteo, que vivia as suas dificuldades tal qual qualquer obreiro ou crente hoje (II Tm4:2)!


A 'Sola Scriptura' nos vocifera que, mesmo depois de 31 de outubro de 1517, a necessidade do mundo e da igreja continua a mesma: Só as Escrituras (Is. 40:8)!
Sola Scripturae!
Pr Eliandro da Costa Cordeiro. S.P.R.C.







[1] “A minha mente é prisioneira da Palavra de Deus”, disse Lutero.
[2] HAGGLUND, B. História da Teologia, Porto Alegre: Concórdia, 1995.
[3] LUTERO, M. Nascido escravo. São Paulo: Fiel, 2001.
[4] Dizia Lutero: “A mesma pessoa é tanto “dois homens inteiros como um homem inteiro.”
[5] LUTERO, M. Luther's works . Lectures on Romans. Saint Louis; Concordia, V.5,1972, p. 302: “Desta afirmação de Agostinho se conclui que pecado original é primeiro pecado, isto é, transgressão de Adão. Pois ele interpreta a expressão “todos pecaram”com referência a algo realizado e não apenas com respeito à transmissão da culpa. Agostinho continua: “Mas se a referência é àquele homem e não ao pecado, e que todos pecaram neste homem o que poderia ser mais claro do que esta expressão”. Mas a primeira interpretação é melhor em vista do que se segue, pois mais adiante o apóstolo diz: “Porque, assim com pela desobediência de um só homem muitos foram constituídos pecadores” (v.19), e isto é o mesmo que dizer que todos pecaram no pecado deste homem (Adão). Mas, mesmo assim, a segunda interpretação pode ser dada, a saber, enquanto um homem pecou, todos os homens pecaram. Assim, em Isaías 43:26,27 “[...] apresenta as tuas razões, para que te possas justificar! Teu primeiro pai pecou [...] o que significa que não podes se r justificado porque és filho de Adão, que primeiro pecou. Portanto, és também pecador, porque és filho de um pecador; e um pecador não pode gerar algo senão a um pecador igual a ele.”
[6] HAGGLUND, B. História da Teologia. Porto Alegre: Concórdia, 1995. p. 196.
[7] HAGGLUND, B. História da Teologia. Porto Alegre: Concórdia, 1995.
[8] OLSON, R. História da teologia cristã.São Paulo:Vida, 2001. p. 395- 396.
[9] A Palavra externa é o livro. Enfatiza-se que a Bíblia é objetiva estável e exterior a nós. Por isso ela é imutável. Podemos aceitá-la ou recusá-la, mas nunca seremos capazes de modificá-la.
[10] Bíblia Sagrada, II Pe. 1:20.
[11] Muito embora, Lutero com o passar dos anos critica tenazmente o método alegórico de interpretação bíblica, ele era literal acerca das alegorias presentes no Novo Testamento. Tais alegorias deixaram de ser alegorias por se apresentarem explicitamente como tal.
[12] BROWN, C. Filosofia e Fé Cristã. São Paulo: Edições Vida Nova, 1985. p. 33.
[13] PIPER, J. O legado da alegria soberana. São Paulo: Shedd, 2005, p.117: “Estudiosos que adotam o método histórico-crítico de interpretação [...] usam vários critérios históricos para negar que certas declarações forma feitas por Jesus ou que certos milagres foram realmente realizados por ele. Mas nenhum desses historiadores afirma que estão recontando a história da Palavra encarnada por causa da inspiração do Espírito. [...] não estou dizendo que não houve ataques ao Jesus histórico, mas que o papel do Espírito não é substituir o papel do Livro, e que a verdadeira Palavra encarnada não é revelada pelo Espírito aparte da Palavra externa.”
[14] Campos, Heber Carlos.Fides Reformata: São Paulo. Janeiro-Junho, 1996. p. 45.
[15] PLASS. What Luther Says. V.1. p. 77.

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